Ser professor nos dias de hoje no Brasil tem semelhanças com ser Judeu na Alemanha na época do nacional socialismo – nazismo.
A questão é profunda e merece um pouco de paciência do leitor para que eu possa fazer as conexões, que, espero justificar minha máxima de abertura.
No dias de hoje, em uma escola, privada ou estatal, quando encontramos uma criança muito boa em “matemática”, que é a matéria mais valorizada, logo dizemos: nossa! Você tem que ser engenheiro ou ‘mexer’ com computador; talvez: seria um bom economista.
Enfim, jamais, sob pena de ser ‘demitido’ da escola privada, você poderá assediar a criança com a idéia: “nossa você é bom em matemática? Será um ótimo professor de matemática.” No caso desse assédio ser com filosofia aí a coisa pode ficar pior. Se um professor e Filosofia disser para um aluno que ele leva jeito para a filosofia… No dia seguinte os pais burgueses ou mesmo proletários estarão na escola. Farão reuniões com o Diretor, o coordenador pedagógico, com a supervisora; Dispostos em uma sala entre o pervertido, digo, professor de Filosofia. De um lado, os julgadores, pais e os burocratas da educação, do outro o subversivo, isto é, o professor de Filosofia.
Geralmente este profissional do abstrato encontra-se maltrapido, barba por fazer, e pronto para discorrer longamente sobre o sistema vigente. O que será abruptamente interrompido pelos pais inquisidores, com todo consentimento dos burocratas da educação. “Conta moço, sem lero-lero, você sabe de alguma coisa? Nosso filho está fazendo uso de drogas?” “Vamos lhe processar por sua indecência, como ousa oferecer Filosofia a nosso filho?” “Você acha que estamos pagando esta escola para nosso filho ser um vagabundo(professor)?”(implícito está: como você!)
Certamente esse professor será demitido e cadastrado em uma lista secreta, da qual todo diretor se vale, e não conseguirá mais arrumar emprego nas escolas privadas. Este inútil só conseguirá “dar aulas” nas escolas estatais.
A prosa acima pode ser ficção ou uma extração e tipificação de algo que existe no Brasil, mas não é mérito só nosso. Ao pesquisar um pouco mais, podemos chegar à conclusão de que a função de professor no ocidente é uma chaga.
Sob a égide do modelo estadunidense, que é do consumo e do entretenimento, encontraremos as causas deste efeito. Professor é uma função que será extirpada do sistema e que, dada a sua função de importância, o próprio sistema terá que se vê com esta exclusão.
O que está por acabar não é só o emprego de professor na escola fundamental. É mesmo todo um conjunto de símbolos ligados a função de ensinar. Como alguns dizem, a violência primeira precisa encontrar realidade no imaginário para depois partir para o corpo-a-corpo. Neste sentido, a função de professor é vergonhosa na esfera simbólica. É sinônimo de ser fracassado ou de pertencer, no Brasil, a uma classe pobre (D e E).
Alguém, culto, mas não familiarizado profissionalmente com a Educação, pode discordar, pois, partindo da experiência que este indivíduo tem de educação, irá recorrer a toda a lógica que recobra a importância de quem ensina. Porém, vale lembrar, a lógica formal, aquela iniciada por Aristóteles (professor de Alexandre – O Grande) não se aplica ao capitalismo. O capitalismo vive e nutre de outras lógicas, talvez a lógica “paraconsistente” do professor Newton da Costa.
O capitalismo e mesmo no que chamamos de modernidade tem como fundamento a idéia de virilidade, na qual se “domina a natureza” pelo conhecimento desta natureza. “Conhecer é poder” neste sentido. A prova que os engravatados tem que dominaram a natureza e que são, portanto, viris, é a ostentação da propriedade.
Ser professor não é viril. É uma emasculação da virilidade, mas aqui não é se trata de uma questão de ordem puramente genital. Virilidade constitui e engendra todo um jeito de ser do ‘indivíduo moderno’. Aqui, não ser viril não é um impedimento de exercer a sexualidade masculina, mas é de existir enquanto pessoa humana.
O professor se enquadra nesta impossibilidade de viver. Sua castração é um aniquilamento do seu próprio ser.
Recorrendo a ficção dos cinemas, precisamente no filme Matrix, ficou clássica a idéia na qual se desliga alguém por dentro, isto é, na Matrix. Para dizer de outro modo, observamos pessoas simplesmente desfalecendo no que tomamos por mundo real, pois ela foi desligada lá dentro, dentro da Matrix. Assim ocorre com a função de professor no mundo da mercadoria. O que está em andamento é que já foi desligada por dentro a função de professor. Os que ainda restam estão com os dias contados para caírem.
O que tem isto com os judeus? Ora, a ideologia nazista construiu ao longo de 80 anos as condições ideológicas que naturalizou no contexto germânico a inutilidade dos judeus. A coisa não foi assim de assalto, no choque. Foi lenta, vagarosa, cotidiana. A ponto de até mesmo os judeus se submeterem ao genocídio sem se revoltarem.
Já temos até campos de concentração e ninguém questiona. O que é, então, as cadeias? O que é uma escola de periferia?
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