Os Mestres da Verdade na Grécia Arcaica
Resenha
(anotações para estudos preliminares)
DETIENNE, Marcel. Os Mestres da Verdade na Grécia Arcaica. Rio de Janeiro: Jorge Zahar,1983.
Cídio Lopes de Almeida
Resumo
O livro apresenta excertos de “Os Mestres da Verdade na Grécia Arcaica” de Marcel Detienne, focando na evolução da noção de verdade (Alétheia) na Grécia Antiga. O livro analisa como a concepção de verdade se transforma, passando de uma noção mágica-religiosa ligada a figuras de autoridade como reis e poetas, para uma concepção mais racional e laica, associada ao diálogo e à política, no século VI a.C. A obra explora a relação entre linguagem, memória, e justiça, contrastando a palavra eficaz do mito com a palavra dialógica da polis. Detienne examina diferentes contextos sociais e institucionais, como assembléias, jogos funerários e práticas jurídicas, para compreender a transformação do conceito de Alétheia. O prefácio de Pierre Vidal-Naquet contextualiza a obra, destacando o paradoxo da existência de “mestres da verdade” e a complexidade do processo de transição do mito para a razão. O estudo usa a lexicologia estrutural para investigar a semântica de termos-chave, iluminando a pré-história da reflexão filosófica sobre o ser.
A obra
O livro “Os Mestres da Verdade na Grécia Arcaica”, de Marcel Detienne, busca compreender a evolução do conceito de verdade (Alétheia) na Grécia Antiga, desde suas origens no pensamento mítico até sua transformação em um conceito filosófico. O autor utiliza uma abordagem lexicologia estrutural, analisando as relações de oposição e associação dentro do sistema lexical grego, para identificar as forças que moldaram a noção de Alétheia.
A obra explora a figura dos “mestres da verdade” na Grécia arcaica: o poeta, o adivinho e o rei de justiça. Detienne demonstra que, nesse contexto, a verdade não era um conceito abstrato, mas sim uma qualidade da palavra proferida em certas condições e por indivíduos com funções específicas.
O Poeta:
A palavra do poeta é associada à Musa e à Memória. As Musas, filhas da Memória (Mnemosyne), inspiram o poeta e lhe permitem conhecer os eventos passados.
A memória do poeta não é uma função psicológica comum, mas uma potência religiosa que lhe permite decifrar o invisível e dar eficácia à sua palavra.
O poeta, ao recitar mitos de emergência, colaborava com a ordenação do mundo, sendo um “funcionário da soberania”.
O Adivinho: O adivinho, como o poeta, possui um dom de vidência que lhe permite acessar um conhecimento especial, revelando o futuro e o invisível.
O saber do adivinho está ligado à interpretação de sinais e à técnica da adivinhação.
O Rei de Justiça: O rei de justiça, assim como o poeta e o adivinho, é dotado de um dom de vidência e memória.
Ele preside ordálias para determinar a verdade, usando métodos como a prova da balança. Sua palavra tem um poder de sedução e de conceder justiça. A justiça, nesse contexto, se expressa por atos e gestos rituais.
O livro também explora a relação de Alétheia com Léthe (esquecimento). No contexto religioso, Léthe é o esquecimento dos homens, enquanto que, no nível do mestre, Léthe é filha da Noite. Alétheia e Léthe são entendidas como um par fundamental, e a palavra cantada, que expressa a Alétheia, também proporciona o esquecimento das desgraças.
Detienne também aborda o processo de laicização da palavra, que transformou a palavra religiosa e eficaz em uma palavra-diálogo. A figura de Simônides de Céos é central nessa análise. Ele representa a transição de uma poesia inspirada para uma poesia como ofício, onde a palavra se torna uma “imagem da realidade”.
Simônides seculariza a memória, transformando-a em uma técnica, e prioriza a doxa (opinião) em vez de Alétheia. Ele é visto como um precursor da sofística, enfatizando a ilusão e a sedução como elementos da arte poética.
Finalmente, o livro examina como as seitas filosófico-religiosas e Parmênides reconfiguraram o conceito de Alétheia. Parmênides, em particular, eleva a questão do ser ao centro da reflexão, contrastando o Ser com o Não-Ser e colocando a Alétheia no cerne do problema. A oposição entre Alétheia e Apáte (engano) torna-se fundamental na busca pelo Ser.
Em suma, “Os Mestres da Verdade na Grécia Arcaica” oferece uma análise detalhada de como a noção de verdade evoluiu na Grécia Antiga, mostrando como a Alétheia passou de uma potência religiosa a um conceito filosófico, através de um complexo processo de transformação social, cultural e intelectual. Detienne demonstra a importância da análise da linguagem e do contexto cultural para compreender a evolução do pensamento e a construção de categorias mentais.
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