Pensando por curto-circuito

Pensando por curto-circuito

 Atenção, esse texto contém palavras que poderão lhe fazer perder o controle de si. Ademais, ele é longo demais, tem raciocínios longos, o que impede “pensar por curto-circuito”. 

         Os avanços
tecnológicos parecem-nos visíveis. A comunicação
mediada por meios eletrônicos, os famigerados computadores e celulares
(telefone portável) nos permite não só comunicar com amigos, parentes e
profissionalmente, mas permite intercâmbio de pagamentos, transferências monetárias, etc. Nesse aspecto da vida cotidiana parece
haver consenso de que vivemos em momento glorioso.
         Porém, a boa
vontade existente nos temas das tecnologias quando salta desse aparente paraíso, que também está
assentada sob premissas problemáticas, e passa para o
âmbito das coisas humanas propriamente, a coisa toma outro rumo. E será nesse
sentido que o título “pensando por curto-circuito” será tematizado.
         Se nesse
texto, o que vou de fato fazer, apresentar algumas palavras-chave, logo, de
modo imediato e por isso por curto-circuito, se chega
a conclusões, que em geral são conclusões que expressam violência simbólica.
Chega-se rapidamente à sensação de que qualquer argumento será em vão. De que a
fala não tem mais sentido, não muda em nada, não comunica
nada. Os xingamentos se seguem.
         Tal reflexão
me ocorreu após ler ou visitar uma página na rede social
facebook. A sensação é de que nada é estável,
tudo é possível. Os argumentos e contra-argumentos
não conseguem produzir consenso, além de mais caos.
         Nesse
vestíbulo de instabilidade social, considerando que ele já é latente nas redes
sociais, pelo menos, pois se tomarmos os dados objetivos da violência urbana já podemos fazer tal leitura
também (mas isso já seria objeto de tempestade; disputas narrativas), lembro que não só há avanços nas tecnologias.
A vida social também conta com avanços e regressos.
         Como
“professor” (palavra que já
podem gerar algum curto-circuito no leitor), faz parte do meu objeto de
trabalho falar, apresentar, aquilo que chamamos,
posteriormente, de período da História Medieval. Logo retomo esse período, para vermos como ele
tem muito a nos ensinar. Os filmes, entretanto,
acabam por atravessar nossa percepção dessa época histórica. Como os objetivos da arte são outros, próprios dela é
claro, a “neteflix”, entre
várias outras empresas, ao
apresentar suas ficções cinematográficas constrói uma
vida medieval
gourmet.  Não é essa que nos interessa, pensamos que apesar de certos oásis de
estabilidade, o medievo
         Posto que o
período medieval pode ser visto para além dos amalgamas que o cinema faz dele,
consideremos que viver em sociedade sempre pode
avançar ou regredir. Como modelo simples, diríamos em termos tecnológicos a
versão “beta”, o período medieval da história ocidental, em termos de relações
sociais, pode ser posto nesse início. Tal estágio social não é exclusivo da sociedade européia. Se observarmos as várias
sociedades humanas pelo orbe terrestre veremos que todas elas passaram por
estágios de maior sofisticação nas relações entre as pessoas e, em dado
momento, sucumbiram. Nesse estágio simples, o caos parece ser uma realidade comum a todas elas.
         O caos social
do período medieval da história foi, com o passar de anos (Queda  do Império Romano do ocidente com Odoacro 476
d.e.c; ascensão da cultura européia com Carlos Magno 768-814 d.e.c considerando
a “renascença
carolingia) se recompondo. Houve um esforço em
sistematizar o saber na forma de Escolas (Escolástica) e a vida religiosa se
refugiou nos mosteiros, que procurou lugares seguros e isolados, no que podemos
inferir como sendo uma estratégia  de
manter uma chama viva de Ordem, ainda que em
laboratório. Dos mosteiros e, depois, das escolas, podemos sinalizar que a
chama do que hoje chamamos de cultura Ocidental se manteve e se multiplicou. Se
hoje podemos dizer que o Ocidente é um desdobramento das culturas judaico-cristá e helenística, tal sequência é possível de
ser, depois da queda do Império Romano do Ocidente, quando colocarmos nesse
meio do caminho os Mosteiros e a Escolástica como instituições sociais que
mantiveram essa chama acesa.
         Segue à essa
“renascença carolingia” um longo período de 1200
anos até nossos dias. Portanto, iPhones são bem mais rápidos para serem
inventados do que as estabilidades sociais. Ao recorrer a período histórico
medieval minha estratégia foi criar a imagem de que viver em sociedade é uma “tecnologia” muito frágil e demorada de ser
construída. O estágio de guerra, como hoje ocorre na Síria, no Iemem, na Líbia,
no Sudão -Sudão do Sul, no Mali, no Haiti, entre vários outros, já é um retorno
à barbarie de uma parte de nacionalidades que compõe
nossa sociedade global. E representam exemplos de que o caos social sempre nos
ronda e sempre rondou as sociedades.
         A diferença
em nossos dias é que os caos regionais estão ligados globalmente. Não só sua
produção, mas o seu fim. O mundo medieval europeu
necessariamente coincidiu na sua época com um “medieval global”. Nesse mesmo
período veremos povos onde conhecemos como China, Índia ou nas Américas que
estavam em outros estágios sociais e tecnológicos. Porém, naquela época, as
tecnologias não permitiam a integração global que
temos hoje. O que nos leva a pensar que os caos regionais, apesar de demorarem
anos para se recomporem, ainda assim o fazem em tempo menor do que o período
medieval. Tal novidade se dá exatamente pelas ligações das partes convulsionadas com regiões estáveis.
         No entanto,
temos em nossos dias a capacidade de produzir o caos global. Temos aqui é sem
dúvidas maneira de dizer, pois na verdade alguns humanos, na frente de
governos, é quem de fato detém essa capacidade.
         Mas retomando
a experiência de caos verbal pela qual passamos nesse momento histórico do
Brasil, a temática que me propus foi que dada algumas palavras se pensa por
curto-circuito. Indicando que tal momento é um retrocesso nas relações humanas
exatamente por considerar que a falência da linguagem
é um tipo de problema muito perigoso.
         Apesar da
visibilidade das coisas, das tecnologias, o que conta, e é mais fundamental,
somos nós humanos. Se nosso “sistema operacional” chamada
linguagem estiver “bugado”, a
coisa é grave. Se a palavra não funciona mais na mediação, o próximo estágio é a violência física, como já temos amostras ocorrendo,
seja em casos diretamente ligado à política (mais uma
palavra que provoca pensamentos por curto-circuito) ou toda a violência urbana que hoje é aferida de várias
ângulos. A incomunicabilidade no seio da sociedade
simplesmente leva a necrose. A morte da sociedade começa pela falência da
comunicação. E o pensamento por curto-circuito é um sintoma grave desse
processo. Não importa o que o outro diga, eu digo as
mesmas coisas. Logo, se de um lado a fala de alguém não é recebida como fala
pelo outro lado, o que temos, já que a fala humana
é assim considerada quando se tem consciência, são rugidos ou qualquer tipo de sons próprios de animais;
especialmente rugidos prévios ao confronto físico, pois a argumentação, a dialética, são avanços nas tecnologias humanas, sem humanidade, resta-nos a barbaridade.
         Por fim, e
agora já se revela momento para juízos por
curto-circuito, as palavras que hoje causam convulsão são:
Lula, PT, social, pobre, negro, gênero,
MST, MTST, esquerda,
lulopetismo, político, vermelho,
etc.
         A página que eu
visitei e verifiquei o maior número de xingamentos por palavras, foi a do MTST.
         Posto as
palavras-chave acima, creio que se alguém chegou até
aqui, já não pensa por curto-circuito. Mas como enfrentar a realidade na qual pessoas que eximiram da política,
sobretudo embebidas pelo consumo, agora se colocam na comodidade das redes sociais a fazer política? Lembro-me que
nos anos 1990 fazer política era ter que ir às reuniões dos grupos de Jovens e
depois nos grupos do partido ou no movimento por
moradia, etc. Não era postar alguma coisa nalguma página
de rede social. Creio que muito menos escrever um
texto num blog.
         Aliás, até
mesmo para ser de direita era necessário participar de algum louvor carismático na Igreja ou fazer uma novena. Os mais radicais,
até mesmo algumas procissões macabras pelas ruas,
carregando uma bandeira, cânticos, distribuição de santinhos.
Claro, uma direita católica.
         A pergunta ou a questão levantada
até aqui é: se a palavra parece ter escasseado o que nos resta fazer? Como
construir o mínimo possível para que a tecnologia” chamada palavra possa ser o
instrumento revolucionário na mediação na vida social? Como utilizar as redes
sociais para podermos conversar e não debater? Como escarafunchar esse
pré-consciente e fazer com que emoções muito
regredidas sejam intercambiadas e permitam que se
estabeleçam vínculos não destrutivos?
         Enfim, ideias
para outros textos, pois creio que o atual quadro, se comparado com os anos 1920, não
é algo novo. Ele tem expedientes muito semelhantes àqueles
que varreram a Europa pré-guerra. Torçamos para um cenário menos nefasto, ainda que isso não nos
impeça de denunciar que estamos indo cadentemente para ele. A semelhança de um MBL com a trupe de Hitler não é mero xingamento. A
diferença que naquela época a fake-news tinha nome de boato e se fazia impressos. Comparar, para desconstruir essa semelhança inferida, Lula com o comunismo é simplório,
creio que seja um argumento que salta a dialética e a
lógica. Pois não há semelhança entre aquela experiência comunista com Lula e a esquerda no
Brasil em nossos dias. Contudo, há semelhança em grupos como o MBL ou a Aurora
Dourada na Grécia, sem
falar dos neonazistas da Ucrânia.
         Para insistir
e ao mesmo tempo construir um argumento, tecnologia fracassada, cito uma entrevista
do dito líder do grupo MBL, Kim Kataguri, junto com a líder dos
estudantes secundaristas de São Paulo. O referido líder
se comporta fazendo mesuras,
quando não atrapalhando à estudante de apresentar suas questões, isto é, provando que a tecnologia do diálogo, do argumento, não
seria possível ali. Vale lembrar, a forma correta de usar essa tecnologia é a
dialética. Lembrando que a palavra
dialética não é comunista, foi inventado lá no século V a.e.c. Platão gostava
mais dela do que seu aluno Aristóteles. Poderia aqui
juntar mais provas para argumentar que o referido grupo não consiste uma opção política, mas um convite à barbárie, já que no exemplo acima, apenas um dentre vários, o
líder do MBL inviabiliza o próprio diálogo, o que podemos concluir?


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