O Presente e a Maçonaria: Angústia sob Imperialismo de Sentido

O Presente e a Maçonaria: Angústia sob Imperialismo de Sentido

O Presente e a Maçonaria: angústia sob imperialismo de sentido

 

Cídio Lopes de Almeida*

A resenha objetiva rascunhar uma hipótese sobre o presente e o desafio maçônico em arrancar-lhe seu sentido. Nossa hipótese é que patinamos, expresso pelo corrente pessimismo e idealização de um passado sem males, e somos levados a reboque das modas imperialistas de sentido. Nosso método é o reflexivo hipotético. Esperamos como resultado partilhar uma resenha pontual com a comunidade maçônica que se sente vanguarda a pensar nos nossos dias. Justifica-se o teor da resenha na medida que a atividade de investigar a verdade é um dos pontos fundamentais dessa sociabilidade baseada em Filosofia de Vida.

Pensar o tempo presente não é uma tarefa fácil. A novidade quando se mostra, e assim é o tempo presente, não está explícito tudo que o compõe. O presente ainda que visto em um dado contexto, porque ele não nos é totalmente desconhecido e por isto faz um certo sentido para nós, deixa escapar vetores fundamentais da sua constituição, que irão se mostrar após o serviço de interpretação dos viventes do momento presente. Talvez aqui faça muito sentido a ideia que nos remete a Heráclito de que “natureza ama esconder”, porque o seu sentido só é alcançado pelo esforço interpretativo levado a cabo por nós humanos.

Estabelecido esta ideia mais ampla, podemos avançar noutras duas ideias no seu interior. A primeira é compreender que o momento presente se mostra de jeitos variados para as pessoas ao longo da história. O que hoje sentimos do nosso presente, não é igual lá na Idade Média. Ou o que uma comunidade de povos Tradicionais isolados da Amazônia pensa sobre o presente não é igual ao que pensam uma comunidade no interior da China de nossos dias. Essas duas ideias podem ser averiguadas pela literatura especializada [livros de sociologia, antropologia, etc]. A segunda questão é como articulamos o presente em perspectiva do futuro. Em épocas imperiais dizem que se tende a não ver futuro, a vida é reduzida ao presente ou a uma saudade de um passado, que nem se sabe se existiu. Imperialismo é quando um poder domina a totalidade da realidade, nos seus aspectos objetivos e subjetivos.  Não se consegue do ponto de vista objetivo encontrar outros modos de fazer as coisas, certas regras econômicas são impostas e nem mesmo se percebe que são assim, e não se consegue imaginar na esfera subjetiva outras formas de viver.  

A ideia de Império não é apenas dos nossos dias, expresso pelo termo neocapitalismo e que adiante retomo. O Império Romano, apesar de distante no tempo, chega a até nossos dias de cultura ocidental. Seja pela literatura, pelo direito e pela Igreja Católica Romana [que mantém variados símbolos romanos em sua liturgia, nomes, organização, etc]. Para alguns a ideia de filosofia estoica tem estreita relação com o imperialismo, numa leitura rápida, a ideia de ater-se ao momento presente, se perguntar o que me compete ocupar-me e o que não compete, pois está fora do meu alcance, seriam marcas desta relação com uma força que domina a tudo na vida das pessoas. Esta força opera até mesmo na inibição das pessoas pensarem algo fora, outra realidade. Restando a elas uma forma de viver resignada, que não ousa questionar a realidade, mas apenas se perguntar como se manter sereno diante de uma realidade que nada resta a fazer.

O presente de nossos dias parece ser possuído por completo por um único sentido. O nome resumido para essa modelagem que captura todo o sentido pode ser expresso com o termo capitalismo ou neocapitalismo. Uma das suspeitas desta afirmação se dá por um certo pessimismo sobre o presente e uma experiência coletiva de não futuro. Há dois sintomas que nos levam a estarmos sob os efeitos imperialistas. A primeira é dar conta de que o presente não vai bem, e recolhemos resenhas de fatos pessimistas, tragédias. Até parece que se tem uma dileção por estes fatos. Depois, parece que não conseguimos manter um contato com o momento presente, ele nos parece estar fora do nosso alcance, nada que fazemos parece mudar a realidade a nossa volta. Em seguida, para se opor ao momento de tragédias, ocupamos nossas falas com idealizações de um passado, que sob olhar crítico de um historiador mostra-se cheia de contradições. E a compreensão deste exercício parece fazer sentido apenas como uma experiência subjetiva de profunda frustração. E sem percebermos, nessa coleção de tragédias do presente e numa dada retomada de um passado [que talvez seria um momento feliz], não temos muito a dizer sobre um futuro, não esperamos nada do futuro.

Até aqui construímos uma hipótese, a de que o presente nos escapa ou é exigente para que o compreendamos. O segundo movimento desta resenha é se perguntar se uma dada comunidade dos viventes em nossos dias vivencia tais dilemas.

Parece-nos que a Maçonaria como uma comunidade baseada em Filosofia de Vida vivencia de modo agudo as dores do nosso tempo. Em certos circuitos dessa comunidade tem sido comum a partilha de uma certa angústia sobre viver no presente. A angústia é um desconforto generalizado que sentimos, mas que não conseguimos dizer precisamente acerca do que estamos sentindo isso ou aquilo. O processo psicanalítico será o de revisitar a si de modos variados para elaborar [construir pensamentos para exprimir o que está em si, mas sem nome] tais sentimentos difusos em si. A intervenção terapêutica busca justamente romper uma visita a certos símbolos ou hábitos, que se tornam repetitivos e sem explicação consciente à pessoa, para poder contextualizar e nomear coisas que estão em nós e estavam despercebidas.

A repetição de uma apreciação negativa do momento presente parece persistente entre os Maçons de hoje. Alguns trabalhos quando tentam moldar uma apreciação noutro sentido, parece não passar daquele exercício de idealizar um passado composto justamente com as faltas de hoje. Contudo, a dificuldade se mostra sobre o futuro.  Falta o cultivo de uma proposta para o futuro, que passaria de modo objetivo por um diálogo com o presente, escasso se considerarmos como sintoma [aquilo que se mostra de algo mais profundo] a média de idade dos adeptos das variadas organizações maçônicas, que facilmente temos a idade de 60 anos como média dos adeptos.

Nesta resenha a ideia em rascunho foi o problema do momento presente, que não é fácil de lidar. Bem como a ideia de um presente capturado por um sentido único, tirânico, exprimível pelo termo e realidade do neocapitalismo. E dentro do qual a sociabilidade baseada em Filosofia de Vida Maçonaria se constitui como coletivo de viventes adeptos que se esforçam para compreender e viver no presente. Não há mensagem além, apenas o problema de que para vivermos o presente devemos ter em mente ser um processo altamente exigente, que não admite amadorismos. Que não nos permite simular passados fantásticos como fuga do presente e que nós adoecemos se apenas soubermos perfilar as tragédias do momento presente. É preciso uma ruptura com o sentido posto e imposto, e como livre pensadores conseguir pensar novos horizontes de sentidos. E pensar novos sentidos é compreender, ao estilo da poética de Aristóteles, que se não há sentidos fora dos atuais, cabe-nos criá-los. Acovardar diante deste desafio é se deixar prender pelos placebos retóricos correntes nas teias das fakes News.

 

* Doutorando em Ciências das Religiões da Faculdade Unida de Vitória.  Membro do Grupo de Pesquisa Cátedra de Teologia Pública (FUV). E-mail: cidioalmeida@gmail.com. Bolsista FAPES. 


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