Escola Polivalente: história de um ex-aluno

Escola Polivalente: história de um ex-aluno

Recentemente tomei em mãos meu histórico escolar. Confesso: fui um péssimo aluno, na verdade, ridículo.
Vamos por parte, pois desse exame de consciência me veio à necessidade de fazer uma longa reflexão do meu processo de “escolarização”.

Primeiro, estudei em uma Escola chamada de “Polivalente”, mas o que é essa escola mesmo?
As Escolas Polivalentes, com construção exótica, precisamente uma arquitetura que foi pensada para regiões que “caem neve”, foi um projeto que teve seu início Legal lá pelo ano de 1972. Trata-se de um conceito de Escola na qual a formação técnica é a tônica. Por isso existiam matérias como Técnicas Comerciais, Técnicas Agrícolas, Educação para o Lar e Técnicas Industriais. Outra característica dessa escola, era a tal formação vocacional, isto é, cada região do país teria cursos de formação da sua juventude de acordo com a realidade. Nesse sentido, em Conselheiro Pena deveria haver cursos ligados ao espectro da agroindústria ou às questões de mineração.
Porém, a história pode ser contada de outro modo. Afinal, por que motivo havia o curso de Técnico em Contabilidade? Essa e outras questões nos revelam que a “boa vontade” em formar a juventude esconde propósitos que não são interessantes para os alunos que aí estudaram.
A primeira contradição que nos revela algo estranho é a arquitetura da Escola Polivalente. Como assim: uma escola para onde cai neve? Mas esse não é o aspecto mais relevante, pois até que a arquitetura é agradável e as telhas de amianto(com o fundo coberto de isopor) com aquele formato estranho, piramidal, propiciavam um ambiente agradável. (O que não ocorre com a arquitetura dos CIAC’s)
A escola ou colégio Polivalente nasce no contexto de uma parceria entre Brasil e U.S.A. Os termos precisos são a parceria entre o Ministério da Educação e Cultura – MEC e o órgão estadunidense  denominado de United States Agency for International Development (USAID). Portanto, os amáveis do norte pretendiam nos ajudar a “desenvolver”.
O modelo  político-pedagógico das Escolas Polivalentes foi utilizado nos U.S.A. Era direcionado para os negros e outras minorias; era uma forma de “absorver” os problemas; gerando  entre negros e latinos a idéia de que através da escola eles conseguiriam direitos e status social que até então estava sendo negado.
O modelo foi exportado  para o Brasil e outros países da America Latina como forma de “conter” possíveis avanços comunistas. Era preciso, portanto um modelo que não falasse em política, mas centrava a atenção na formação técnica; Era preciso formar a mão de obra para fazer o Brasil ser “evoluído”.
O contexto foi ótimo para a economia baseada nos privilégios. Os ricos continuaram ricos e ainda poderiam diversificar suas riquezas, pois poderiam se aventurar no mundo da Indústria. A escola cumpria dois propósitos: desmobilização dos pobres e formação de “mão-de-obra” dócil e qualificada.  
A moda na década de 70 era formar o técnico. Desenvolver as regiões através da transformação técnica da natureza.
Porém, parece que a verba só deu para construir os prédios. (o que propiciou muito lucro para a empresa que ganhou a licitação). Como sempre, o belo projeto cumpriu apenas o propósito de gerar a ilusão de que através da escola “vou ser alguém”.
Ainda nessa mesma década de 70 a educação privada tomou o lugar de formar as elites (é nessa época que surge os grupos educacionais: Objetivo; Positivo, etc) e a escola “estatal” a formação das massas pobres.
Nessa mesma época a matéria de Filosofia foi retirada dos currículos das escolas. Pensar ou filosofar ficou associado a vadiagem e coisa de comunista. Espero que não associem nos dias de hoje Filosofia com os extremistas islâmicos.
Enfim, essa é a escola Polivalente que tanto me encantou na infância e adolescência. Uma escola preparada para me formar enquanto técnico.
Retomando o outro tema desse texto, algo bem pessoal, os motivos que me levam a considerar  minha vida de estudante ridícula são as notas do meu “Histórico Escolar”. Eram sempre 51, 55,  sendo que a média era 50. Minha formação de ensino médio foi a de Técnico de Contabilidade, não me lembro de nada, nunca trabalhei  como técnico de contabilidade. Enfim, eu fui de fato um péssimo aluno.
Contrariando a política, acabei estudando Filosofia e Teologia, mas não satisfeito, acabei estudando artes e pedagogia. Para coroar o processo de vadiagem e perversão do sistema, tornei-me mestre em Filosofia e estou preparando o Doutorado.
Conclusão
 O texto é pessoal e nada filosófico. Para quem quiser leitura técnica remeto ao artigo de José Alfredo de Araújo[i]. A intenção do texto é propor, a partir da minha experiência, uma reflexão sobre si. Nesse caso, que tipo de aluno eu fui? Esse exercício é muito importante, pois ele influi na educação que estamos propiciando a nossos filhos, sobrinhos e netos.
            Aproveito para fazer alguns agradecimentos. Agradeço a professora Reuza. Pela severidade planejada, penso que isso me auxiliou a ver que era possível se empenhar e conseguir algo. Peço desculpas a professora coordenadora pedagógica, que agora me fugiu o nome, por ter fugido do castigo que me impuseram para aprender tabelinha.
Agradeço a professora Marta Pimenta por ter me ensinado Geografia e respeito. A professora Janet e Elenice de quem não aprendi nada de matemática, mas o gosto delas pelo ato de ensinar me fez, na faculdade, a compreender a importância de ensinar. A “dona Eva” e “dona Shirley” pela paciência e respeito com meus conflitos pelas ocasiões mais difíceis de minha vida de adolescente.
            Enfim, a lista é longa e prefiro terminar por aqui. Espero que ato de reconhecer as limitações da minha vida de estudante não implique em delegar créditos a vocês, caros professores. Espero isto sim, que os leitores, provavelmente pais, façam um exame de consciência e retomem a importância do professor na vida de seus filhos. E que nesse momento, passe a ser um auxiliar desse profissional de suma importância na vida de qualquer cidadão. Nunca desabone um professor, você, pai e mãe, estará desabonando você mesmo.
 

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