RESENHA
ELIADE, Mircea. A Nostalgia das Origens. Tradução de Vergílio Ferreira. Lisboa: Edições 70, 1978.
Cídio Lopes de Almeida
Resumo
A obra de Mircea Eliade, A Nostalgia das Origens, argumenta que a busca pelas origens, um tema recorrente na história intelectual ocidental, é influenciada pela experiência do sagrado e pela nostalgia pelo “primordial”. Eliade examina diversas culturas, como os Dayak, os aborígenes australianos, os Guaranis, os indígenas norte-americanos, os Iroqueses, os Pueblos, os Maidu, os chineses e os indianos, analisando seus mitos e rituais para demonstrar como o conceito de dualismo, com seus pares antagônicos e complementares, desempenha um papel fundamental na compreensão do mundo e da condição humana. Através de exemplos específicos, ele destaca como a polaridade cósmica e a polaridade humana se entrelaçam, influenciando a vida social, ritual e as especulações filosóficas.
Uma Jornada Através da História das Religiões: Mitos, Símbolos e a Busca pelo Sagrado
O livro de Mircea Eliade, apresentado nos trechos fornecidos, nos convida a uma profunda imersão no estudo das religiões, explorando temas como a natureza do sagrado, a interpretação de mitos e símbolos, a busca pelas origens da religião e o papel da história das religiões na cultura moderna.
Um novo humanismo através do Sagrado: O autor argumenta que o estudo das religiões, especialmente as arcaicas e exóticas, possui relevância para além do seu valor histórico.
O confronto com mundos de sentido desconhecidos pode levar a um novo humanismo, enriquecendo a compreensão do homem moderno sobre si mesmo e o mundo. A dessacralização da sociedade moderna torna o estudo da experiência religiosa ainda mais crucial.
A obra defende uma abordagem hermenêutica para o estudo das religiões, buscando compreender o significado dos dados religiosos no seu próprio contexto.
A erudição é importante, mas não suficiente. O historiador das religiões deve identificar e elucidar as situações e posições que deram origem aos fenômenos religiosos. É necessário considerar o condicionamento social, mas sem reduzir a experiência religiosa a um mero epifenômeno da estrutura social. A obra destaca a importância do estudo da mitologia e dos símbolos, reconhecendo a influência de Freud na demonstração de que as imagens e símbolos comunicam mensagens mesmo inconscientemente.
A busca pelas Origens: O livro explora a fascinação do século XIX pela busca das origens da religião, impulsionada em parte pela crise do cristianismo histórico. O autor apresenta diversas teorias sobre as origens da religião, como o animismo de Tylor, a ideia de mana de Marett e a precedência da magia proposta por Frazer. A obra reconhece a influência dessas teorias, mas destaca que a busca por uma única origem da religião se mostrou infrutífera. É questionado se a impossibilidade de encontrar uma origem única impede a compreensão da essência dos fenômenos religiosos.
Ele sugere que a historicidade da experiência religiosa não a define completamente, e que a busca pela compreensão do sagrado deve ir além dos condicionamentos históricos.
Crise e Renovação da História das Religiões. O livro lamenta o papel modesto da história das religiões na cultura moderna, em contraste com a sua proeminência no século XIX. A excessiva ênfase na análise e erudição em detrimento da interpretação e síntese cultural é apontada como uma das razões para essa perda de relevância. A história das religiões precisa recuperar a sua capacidade de oferecer uma hermenêutica criativa, capaz de revelar novos valores culturais e transformar a consciência humana.
O repertório temático do livro dedica capítulos específicos ao mito cosmogônico, o papel do paraíso e da utopia na geografia mítica e escatologia, e a importância da iniciação, tanto em sociedades tradicionais como na cultura moderna.
Para Eliade enfatiza a centralidade do mito cosmogônico em sociedades tradicionais, onde ele serve como modelo para todas as criações e como base da história sagrada. Ele defende a importância de estudar os mitos em culturas onde eles ainda são vivos, argumentando que a mitologia grega, embora influente, foi desmistificada pela análise crítica.
O capítulo sobre Paraíso e Utopia explora a persistência do ideal de um novo começo e a nostalgia por um estado de perfeição original. A obra analisa como esse ideal se manifestou em movimentos messiânicos, na colonização das Américas e na literatura americana. O capítulo sobre iniciação destaca a importância dos ritos de passagem como processos de regeneração e transformação espiritual. A obra explora a persistência de temas e símbolos iniciatórios na cultura moderna, especialmente na literatura, artes plásticas e cinema. Eliade sugere que a fascinação moderna pela iniciação reflete uma nostalgia por uma experiência de renovação total, num mundo dessacralizado.
O livro de Eliade apresenta uma defesa apaixonada da história das religiões como disciplina humanística essencial, capaz de enriquecer a compreensão do homem e da sua relação com o sagrado. Através da análise de mitos, símbolos e ritos, e da exploração de temas como a busca pelas origens, a nostalgia do paraíso e a importância da iniciação, a obra nos convida a redescobrir o significado profundo da experiência religiosa e a reconhecer a sua persistência, ainda que transformada, na cultura moderna.
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