A desvalorização do professor enquanto cultura popular

A desvalorização do professor enquanto cultura popular
O Brasil vive hoje repercutindo muitas coisas mundiais. Não dá para fazermos afirmações sobre fenômenos sociais pensando que ele é só brasileiro. O bordão que diz “pais de m…” é uma mediocridade sob vários ângulos, sobretudo o de pensar que tal fenômeno seja só nosso. 
É a globalização, especialmente dos problemas. Nesse sentido a figura do “professor”, especialmente do professor de educação básica, sofre diminuição e não é uma profissão almejada. Até quando lemos que lá na “Islândia, Filandia, Suécia, etc.” há maravilhas, penso que é preciso chegar as informações um pouco mais. Certamente comparando com o Brasil tudo fica mais amplificado, pois de fato temos uma base material desfavorável somada à base “auto-imagem” do brasileiro só poderemos ter resultados péssimos. 

Mas naqueles países, uma espécie de projeção do paraíso para os brasileiros, a história é diferente e por isso os quadros podem ser mais favoráveis à figura do professor. Aqui, e depois falo deles, temos uma experiência muito ruim com a educação. Se tomarmos nossa história, veremos que o Poder sempre se exerceu em outras bases, nunca precisou do saber/poder. Até nossos “bacharéis” da República nascente não exerciam propriamente seus saberes; o saber era mais uma ilustração do que um instrumento de efetivação. 

Daquela época aos dias de hoje, grosso modo, parece que a coisa não mudou. Adicionemos ainda a cultura de consumo de massa. Moda que nos impele à existência possuindo coisas. Essa chaga que varre o mundo, tem cara específica em países como o Brasil. Saltamos do meio rural e caímos na cidade; logo em seguida vem o consumo de massa. Nesse cenários educação nunca esteve no horizonte. 

Não se trata de dizer que as pessoas são más, malevolentes, etc. Trata-se de pensar a vida e suas estratégias para mantê-la; foi assim também em França; a diferença lá foi apenas o tempo; houve muito tempo e muitas revoltas para se chegar à França de 1800… É a tal da história e quem chega primeiro nela. 

Assim, no Brasil, a vida no mato não pedia caneta e papel. Pedia força física, pedia habilidade manual, pedia bravura. E nada disso passava pelo papel. É essa massa que hoje encontramos na Escola Pública. O seu desprezo pela educação é de uma história na qual tal atividade nunca garantiu uma melhora de vida. Doutro lado, já na moda consumista, privar-se como é próprio da vida de estudos, também foi acossado. 

Nesse contexto temos portanto uma sociedade que não valoriza a educação e o professor. Não o fazem não por uma opção calma e serena, mas por uma longa realidade na qual professor e educação não fizeram parte e não somaram forças para que a vida fosse melhor. Lembro-me que na escola que estudei lá em Minas Gerais, na famigerada Cartilha Caminho Suave, nunca via nada da minha vida cotidiana. Tudo era de fora; minha vida de criança não encontrava eco entre os “córregos” (corguinho), as montanhas e os livros. No livro falava-se de “navio” e mar, mas na minha realidade tais coisas não existiam. A topografia mágica no meio da qual via-se montanhas de pedras de mais 400 metros de altura não era nunca citada nos livros.   Portanto, não bastasse a dificuldade da escola se relacionar com o campo, a educação daquela escola era urbana. Mesmo sendo localizada no meio do campo, sua ideologia era urbana. 

Desta forma temos uma cultura que odeia a escola e todos os que estão vinculado a ela. Em outro cenário, a França por exemplo, não se trata de pessoas que amam a mesma escola. Naquele contexto o que podemos observar é que a escola e conhecimento tem interferências concretas no sucesso das pessoas. A França é um país que investe muito em educação, pois é concreto o retorno que o país tem. Eles não investem na mesma escola brasileira, que é desligada da vida; lá tem-se prova que ciência e tecnologia gera emprego, produz dinheiro e bem estar. 

A prova dessa tese pode ser encontrada na própria França. Após séculos de colonização sobre os países da África tal país experimentou que “invenções” técnicas trazem muitos lucros. As feiras internacionais, na qual surgiu a Torre Eiffel para demonstrar a tecnologia de construção estruturada, provou-se como sendo algo estratégico na produção de dinheiro.  Essa mesma França imperialista colheu desse cenário algo contrário. A saber, a imigração que hoje atormenta os partidários da direita francesa. 

Entre esses migrantes, que em geral estão morando nas periferias da várias cidades francesas, temos a prova de que a educação só é valorizada quando nos propicia coisas concretas. Entre a juventude migrante a escola francesa é um problema. Tal escola apresenta-se a eles como obstáculo; os índices de violência em tais lugares assustam nossa ingênua percepção de que “la fora” é tudo “mais legal”(sic). Tal ocorrência me leva a inferir que a Escola não fala a “língua” desses migrantes. Não faz parte da realidade concreta deles. 

Longe de pensar que os migrantes são burros, mas me parece que a eles a escola não diz nada. Mesmo já sendo filhos de migrantes, a experiência de seus pais não passam pela educação; os pais trabalham em coisas que não demandam escola; o “herói” deles não é um homem ou mulher que detém muito saberes escolares; o herói é aquele que migrou; Soma-se a isso, a presença da cultura de consumo de massa que também não valoriza a privação que é própria da aquisição do saber. 
Portanto, a cultura escolar ou a cultura da aquisição de saber necessita de ao menos dois pontos. Primeiro uma cultura da privação, ter conhecimento é saber privar-se, abrir mão de querer tudo, concentrar-se nesse ponto e não nos milhares restantes. O segundo ponto é a aproximação do saber à vidas cotidiana das pessoas. A escola precisa, sobretudo no início da adolescência, concentrar-se em pensar com o jovem seu entorno. É preciso saber puxar essa realidade pela qual ele anda todos os dias para dentro da história do saber científico. Sem esses dois exercícios continuaremos a perder para a cultura de consumo; sua base é concreta e nos pega por dimensões naturais de nossa condição; os desejos, as necessidades. 


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