Os grupos de política do WhatsApp

Os grupos de política do WhatsApp

Os grupos de política do WhatsApp

Citação:

LOPES DE ALMEIDA, C. Os grupos de política do WhatsApp. AMF3: São Paulo. 2022. Acessível em:https://amf3.com.br/os-grupos-de-politica-do-whatsapp

Prof. Me. Cídio Lopes de Almeida

AMF3 Escola de Filosofia

 

Introdução

Nessa redação o tema objeto é o fenômeno dos grupos de WhatsApp. Pretende-se trançar sua característica fundamental e tratar de um dos seus efeitos colaterais, que é a captura temática por dos espectros políticos. Espera-se com esse trabalho fornecer elementos ou subsídios para se pensar a política de forma mais qualificada.

 

1.  Os grupos de esquerda e os de direita

Frequento grupos virtuais não importa a linha política. Como professor de filosofia procuro ser aquele que vê na formação política em sentido lato, como os antigos gregos consideravam, o instrumento fundamental para a vida em sociedade democrática. Minha posição política é clara e não comporta flertes com absurdos e que estão para além do jogo democrático, que é fundado numa dada cultura majoritária.

O que posso notar entre os grupos é um tipo de retórica não especializada e genérica. Escolhe-se uma única pessoa que represente um oposto ao que é a corrente do grupo e passa-se a atacar tal figura. Se da esquerda o bode expiatório será o da direita, no contrário, a direita escolhe um da esquerda e ali deposita qualquer coisa que soe ofensiva.

Nos dois casos o que temos é falta de lógica e tranquilidade para pensar os assuntos. O ódio movimenta as ideias nos dois lados da política. Adiante retomo uma das consequências que esse falara para convertidos acaba por produzir e, como consequência, empobrecer a política e a democracia.

 

2. A política como a praça comum a todos

A qualidade do engajamento político do brasileiro em geral é bem inferior se comparado com os argentinos ou uruguaios. Comparar nos ajuda ter uma noção de onde estamos, ainda que não é tudo para conhecermos de fato quem somos. A política é um dos temas, como educação e saúde, que interessa a todos nós. Daí minha ideia de uma praça pública. Portanto, qualquer que seja a formação cultural e escolar da pessoa ela terá que ocupar dessa coisa comum a todos.

O tema comum gera a situação na qual as pessoas envolvidas não sejam profissionais do tema. Assim, na qualidade de pai e mãe, precisa-se saber um pouco de educação, pois temos filhos envolvidos nessa dinâmica. A saúde também está na mesma linha. Por fim a política que nosso tema aqui. Porém, há dois tipos de pessoas que se ocupam dos temas comuns. A primeira é o não profissional, como aludido, mas existem pessoas que são profissionais disso.

  Em educação os professores deveriam ser os “entendidos”, como os médicos são na saúde. E na política os “cientistas políticos”, como aqueles professores que ensinam sobre o tema. Contudo, aqui um fato peculiar. Os debatedores não profissionais da política acabam por não se darem conta dessa distinção. E por não serem profissionais, perdem a noção dos limites ou da forma profissional de pensar a política. E movidos por afetos, que tem sido infelizmente o ódio, tece largas redes de pensamento que demanda um um status social idêntico ao profissional do ramo.

Sem a noção de poder estar sendo caricato, sem os devidos cuidados comparativos ou mesmo a estruturação das ideias que devem sempre estar em diálogo com uma dada fortuna literária, o “político” amador tem tomado a cena do que seja a ação política. Esse fenômeno tem sido global ou ao menos na parte do mundo que o acesso a internet seja facilitado.

Se adicionarmos a esse fator uma particularidade da sociedade brasileira, uma baixa erudição cultural, mesmo entre os formados na universidade, temos a política como tema comum sendo feita de modo muito simplista. Nos sistemas educacionais brasileiros o lugar das humanidades perde lugar de várias formas. Primeiro pela hegemonia de um arremedo de cultura matemática nas escolas básicas. Em seguida pela ausência de uma formação humanista nos cursos universitários que são os mais buscados pela classe média, as famigeradas engenharias, medicina e direito. Esse lugar de protagonismo que próprio da classe media acaba por ser ocupado por pessoas sem tal cultivo cultural.

Aqui não se trata do tradicional ataque à classe média que podemos rapidamente encontrar em certos setores da vida universitária. Para além da polarização, a classe média existe e tem seu papel a ser desempenhado. Um deles é justamente ser uma instância social que consegue elevar a media geral dos temas “comuns” a todos. O que não notamos justamente isso. Por haver uma redução dessa classe à ideia da formação útil, capaz de gerar emprego para seus filhos, ela se coloca como operadora de algo já dado. No nosso caso cultural, essa classe média se compraz em operar as ideias das potências políticas dominantes. Ela se compraz em achar que saber inglês seja erudição, não consegue nem sequer pensar o que seja fruição cultura.

Seria o papel dessa classe média, que para além da crítica erosiva da esquerda, tem sim seu papel e pode ser outra coisa do que notamos hoje. Cabe a ela ser justamente essa instância do tecido social brasileiro a elevar a qualidade do debate comum a todos. Romper com o simplismo dos debates montados na mais simples estrutura neurótica de uma comunicação violenta.

O próximo subtema é justamente um dos efeitos desse simplismo. A saber, como certos temas são capturados por um dos lados, e todos nós perdemos com isso.

 

3. A captura de temas e seu empobrecimento

A título de provocar os pensamentos, se for mencionado a expressão “Família, Tradição e Propriedade” todos vamos pensar na direita política. Por outro lado, se fosse apresentado a expressão “proletários”, “sindicatos”, “luta de classe”, “direitos humanos”, as ideias logo seriam direcionadas à esquerda política. Com essa provocação a ideia nessa seção do texto é tratar de como perdemos todos com essas “capturas” temáticas que assistimos com o baixo nível da discussão política. Os temas não deveriam aparecerem só num espectro, pois, como veremos, eles são do interesse de todos.

Creio que seja o aspecto mais prejudicado da vida social coletiva quando certos temas são interditados. Assim o trabalhador nunca consegue pensar que ele pode ser um empreendedor e virar um empresário. De certo modo o assunto aparece no contexto de precarização do trabalho formal, e nesse sentido as críticas da esquerda são pertinentes. Achar que ser “uber” é ser empreender é piada e faz parte da baixa cultura política dos setores mais ligados a cultura empresarial brasileira. Ao confundir livros de “autoajuda” empresarial como sendo teoria das ciências gerenciais. No entanto, interditar o debate ou identificar como sendo coisa da “direita” pode ser aqui um bom exemplo do que estamos a desenvolver, a captura de temas por um dos lados políticos.

Para não ficar só de um lado, lembro o tema da integridade territorial brasileira como capturado pela direita. E que a esquerda precisa posicionar-se de outro modo urgentemente sob pena de ficar mau na fita num futuro próximo. Habitualmente no discurso de esquerda tem cultivado destacar apenas aspectos negativos do que hoje constitui o grande território que é o Brasil, mas se esquiva a admitir que hoje somos beneficiados diretamente dessa conquista do passado.

O que quero destacar que é preciso avançar no debate político. É preciso aprofundar os temas que são do interesse de todos. Mesmo não sendo do teu “partido” tenho a aprender com você algo e que a diferença não seja o fim do mundo. O diferente não pode ser algo a ser eliminado e associado ao abjeto. Essa classe media precisa também fazer subir a discussão política para o “médio” e seu papel é fundamental para uma sociedade mais justa. Portanto, ela também tem que ter como tema não só seu interesse imediato pessoal, mas compreender que há algo “comum” necessário para ela ser enquanto classe media. Implica, por exemplo, pensar que a educação pública deve sim ter um papel de formar cidadãos e lugar de interação das várias classes sociais. Sendo o primeiro estágio dessa política como convivência comum com todos os diferentes.

 

Conclusão

     A ideia desse breve texto é jogar uma chave de leitura nova na cena da política de WhatsApp”. Não era pretensão ir mais adiante e sim ocupar-me dessa função professoral de introdução. O texto tem ainda como perspectiva os alunos dos meus cursos livres de Filosofia e as sociabilidades culturais em geral, tais como Lions Club, Rotary, Eubiose e Maçonaria. Creio que são espaços muito estratégicos para se construir uma nova cultura democrática que passa por elevar o que seja o debate “comum”. A política que se cultiva nesses círculos, mesmo que passíveis severas críticas, pode ser o foco desse novo posicionamento. Para além do grupo do “zap”. Nesse sentido, penso que a chave está lançada e nosso projeto continua a militar nessa causa da difusão filosófica como fundamento da vida social pautada pela democracia.

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